Quarta impressão - Final da série Web 2.0
— Cara, você já viu como as
pessoas estão presas a tecnologia, tudo refém! Ninguém mais sabe acender um
fogo de carvão, é preciso que se tenha uma churrasqueira turbo-mega-plus-
microssitema-xptod2-trans-computadorizado, com timer automático, resposta de segurança rápida e exclusivo alarme que informa o horário de encerrar o final de semana.
microssitema-xptod2-trans-computadorizado, com timer automático, resposta de segurança rápida e exclusivo alarme que informa o horário de encerrar o final de semana.
— Vixi! Que é isso? Nunca vi um
bicho destes!
— Verdade. Existe!
— Pois é, como se não bastasse
sermos escravos das ideologias, dos dogmas, da politicagem e outras sandices da
civilização... Agora precisamos ser escravos dos aparelhos eletrônicos, dos
manuais multilíngues e da criatividade ofegante.
— Credo, não precisa tanto. O que
você anda lendo?
— Não é caso de leitura, é
observação um tanto complexa de um mundo prolixo. O moto-contínuo inexistente faz de um
tudo para prevalecer, transformando pessoas em autômatos.
— Não vai me dizer que você
acredita nestas porcarias aristotélicas?
— Não acredito, e não é nem por
causa de Aristóteles, mas pelos que vieram depois dele...
— Humm! Não entendi nada, quer dizer que você está estudando filosofia às escondidas? Porra cara, esta valeu meu dia!
— Humm! Não entendi nada, quer dizer que você está estudando filosofia às escondidas? Porra cara, esta valeu meu dia!
— Não se anime muito, estou só
fazendo umas pesquisas e leituras soltas.
— Leituras soltas, rá, rá, rá...
Está gostando? Tá lendo o que?
— Tenho lido um monte de coisas,
comecei acreditando em uma ordenação universal, depois descobri que o universo
é caótico e controverso, o mundo é um embuste, a civilização é uma falácia. Não
há verdade fora da dúvida, e nem sobre isso posso ter certeza.
— Caraca! Que salto! Você saiu do
antes de cristo, indo beber direto nos anticristos...
— Velho, não pira, não bebi nada.
Estou é bastante confuso, mas não sou nenhum anticristo.
— Calma... Não foi o que eu quis
dizer, estava referindo-me aos autores que você parece estar lendo.
— Então deixa pra lá! Melhor que
falemos sobre pessoas e celulares...
— Sendo isso o que você quer,
faço um alerta muito sério... Depois que as dúvidas se instauram, somente com a
fuga da realidade é possível viver no mundo que nos é oferecido.
— Então o mundo é diferente do que eu vejo? Você esta falando em loucura,
esquizofrenia ou o quê?
— Ainda não. Estou falando que é
preciso recriar um mundo onde certas percepções e sentimentos não nos
incomodem. Uma fuga simples para o berço da convivência comum em sociedade. Uma
das saídas é misturar-se a massa em seu delírio compartilhado. O outro modo é ser
o que você está sendo agora... Um corpo estranho, um camelo em meio aos
nelores®. Freud explica!
— Quase entendo o que esta me
dizendo, mas não ajudou muito. Conta logo aí um dos seus casos estranhos sobre
pessoas que só você conhece e não pode dizer o nome.
— Não é bem assim, não preciso
citar nome de ninguém, uma pessoa é sempre muito igual as outras.
— Tá bom, fala aí o que você tem
ob-ser-va-do!
— Certo... Estávamos falando
sobre tecnologia e escravidão social, então comecei a perceber que as pessoas
não se reúnem mais as portas das suas casas para bater papo, trocar receitas e
combinar almoços. Agora o que vemos são pessoas tristes e solitárias,
principalmente os idosos, que se sentam com os celulares ao lado, esperando uma
porra de ligação que nunca chega.
— Só isso?
— Ou então estudantes que vão
para o pátio da escola teclar em seus aparelhos e trocar memes de achincalhe,
muitas vezes de si mesmos, ao invés de estarem falando sobre baboseiras de
adolescentes ou participando de atividades criativas.
— Só isso?
— E as famílias, os casais, os
grupos de amigos, que vão para a pizzaria, ao invés de conversarem entre si,
ficam a trocar mensagens, nunca com outros distantes, mas entre eles mesmos.
— O que há de ruim nisso, as
pessoas não estão se comunicando?
— Você não entendeu? As pessoas
não se encontram mais, os relacionamentos acontecem por redes sociais, e-mails
e chats. As pessoas se contentam com as fotos do almoço, dos netos, do cachorro
novo, da nova tinta da varanda. Ninguém se conhece mais do que pela imagem
plana de um avatar. Ninguém mais tem uma agenda de endereços. Tudo está na
internet, boiando em uma solução invisível de eletromagnetismo aparentemente controlável... E, se esta merda sofrer uma pane geral? Você vai
saber encontrar a casa nova do seu pai?
— Vai ser difícil, tenho umas
fotos da casa e sei em qual bairro fica, mas não tenho o endereço...
— Então, é sobre isso que
estávamos falando anteriormente, vivemos em uma ilusão controlada por nós
mesmos. Acreditamos estar mais próximos das pessoas, enquanto nos isolamos cada
vez mais.
,
Muito bom! Lembrei-me de Jean Baudrillard e as suas abordagens filosóficas sobre simulacros e hiper realidade!! :D
ResponderExcluirOs indivíduos e as relações, estão cada vez mais virtuais, enquanto a realidade vai se tornando metafísica.
ExcluirNovos tempos
ResponderExcluirPois é, veio célere essa tecnologia
Com intuito de pessoas aproximar
E deixar a sociedade em harmonia
Num avanço direção a outro limiar.
Porque o que veio é novo começo
E, as vezes, as coisas dão errado
E humanidade então paga o preço
De não ter compreendido recado.
Einstein não jogava conversa fora
Então viu o homem deslumbrado
Que esqueceria a vida de outrora
E ser humano que está a seu lado.
Aderiu somente ao aqui e agora
Apenas pelo celular apaixonado.
Caminho sem volta, nobre Jair!
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